domingo, 14 de junho de 2020

Portugal 40: Em Burgos, com el mio Cid e Manoel Pereira.




Só a noite nos une. O breu da noite liberta as almas dos seus lajedos. Nessas horas noturnas, em que a lua alta cobre a catedral com um manto azul, encontro a tua sombra deslizando furtiva pelo arco do Portal de Santa Maria, a grossa bainha da espada projetando o seu funesto gume entre revoadas de anjos que voltejam entre os pináculos e as cúpulas das capelas doiradas.
Atravessando a ponte a passo largo, ligeiramente vergado ao peso dos cinzéis e maços de ferro, Manoel Pereira retoca apressado a pedra branda das estátuas de guerreiros e bispos e desaparece entre os arcos da Cartuxa de Miraflores, num diálogo interminável com os seus cristos sofridos, humanas frontes erguidas num severo queixume, apenas um murmúrio, quebrando o voto de silêncio de San Bruno e a eternidade.

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