quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Portugal 13: Passeava um dia com Epicuro num dos jardins onde reunia os seus amigos...

Passeava um dia com Epicuro num dos jardins onde reunia os seus amigos e, contra os preconceitos da
época, admitia mulheres sem serem cortesãs. Na verdade, era a minha sombra do futuro que se atravessava entre estas figuras clássicas, negras e esguias como nos seus vasos, levemente vestidas com grandes togas e túnicas, talvez já de cambraia finíssima da Índia ou seda natural da própria China, mas mais provavelmente de pano cru de linho ou algodão. Aqui florescia o jacinto dos poetas, a flor hiacintina e a rosa albardeira que cobria a encosta árida rivalizava em cor com a nobre rosa de Mileto. Da Pérsia vieram pessegueiros de flor rosa e nos zambujeiros bravos alimentavam-se os pássaros do campo, o gaio azul e o melro cor de azeviche. O mar era de um azul forte e metálico e o céu de um azul claro, e quebrava as suas ondas como se fora o vento a bramir nas vagas. Estavam reunidas todas as coisas graves e importantes da vida. A elegia breve e simples de um fim de tarde e a solenidade do mar sem fim. Epicuro sentou-se a escrever. Tinha uma bela pena de pavão oriental e a luz tirava reflexos púrpura das grandes letras desenhadas num pergaminho espesso e macio: “O mais aterrador dos males, a morte, não tem nenhuma relação connosco próprios, porque precisamente, quando nós existimos, a morte não está lá, e quando a morte está presente, então nós já não existimos.”

Afastei-me por dois mil anos, para reflectir sobre estas palavras.

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