quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Portugal 15: Não sei quando inventámos a música. A princípio foram certamente cantos de trabalho, a polifonia dos ...

Não sei quando inventámos a música. A princípio foram certamente cantos de trabalho, a polifonia dos
membros e dos peitos arquejando, Mas não tocariam já os pastores as primeiras flautas para enfrentar a escuridão das noites? E o tambor, começou a soar na hora em que a fogueira iluminava os medos, e o ar frio e a fome traziam as alcateias a rondar os povoados e faziam sair da montanha os dente-de-sabre? Teria nascido desta dor, deste horror inominável? Mas também da nossa argúcia de caçadores, soprando nas canas para imitar os patos, arqueando o ar nas conchas das mãos para chamar o perdigão... E depois, do encantamento dos pássaros, rouxinóis de barro e água para embalar os nascituros, ocarinas que respondem ao cuco...

Evoco os vagabundos de Gorki, vovó Lionka aquecendo os netos na estepe gelada com o canto dos barqueiros, no céu da Rússia a grande Oka de prata iluminando-lhe a fronte, e nas salinas os pés gretados dos carregadores cegos pelo brilho dos cristais, cantando sempre, e os negros de Port au Prince, sufocados de café e de sol, ritmando o passo, e as artes do cerco dos pescadores içando a rede a cada impulso das suas cantilenas...e Santa Teresa, em êxtase místico, o coração trespassado pelo cântico dos anjos...

Conheceis a história do monge que acordou com o concerto do rouxinol e o acompanhou aos seus refúgios de sombra, até que, protegido pela mata frondosa, ele se calou?! E eis que, regressado ao mosteiro, achou-se perdido no tempo, pois tinham passa mil anos?! Divina música, portanto.

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